sexta-feira, 31 de julho de 2020

Ali

Eu poderia começar essa história falando de Ali Baba e os quarenta ladrões. Minha vontade é sempre atravessar a fronteira imaginária, ir para o lado de lá, e contar as mil e uma histórias que Sherazade já contou, mas eu ainda não contei. Mas, não é desse aí,  e sim daquele ali, que eu quero falar.
Onde é ali?
Me dei conta que eu coloco ali em tudo, e isso também não é um tempero, mas apenas um vício de escrita que aparece sem ser chamado. Nem me percebo escrevendo a palavra, mas noto ela fora do lugar toda vez que eu releio e reviso o texto.
"Mas que raio eu coloquei esse ali aqui?"
Resolvi então escrever um texto em homenagem ao meu ali, que nem sei onde fica e nem sei porque aparece aqui. Vai que ele some depois de ter uma atenção especial sobre ele.
Então, o que é ali? Onde é ali? Como é ali? Por que ali?
Responder poderia ser uma saída, mas acho que não, porque tentaria colocar o ali aqui e ele se fixaria ao invés de ficar livremente achando onde se enfiar entre as palavras que comunicam algo que não dizem de lugar nenhum, talvez de estados ou de estilos.
Ontem, a voz soprou que resposta pode ser lida como res posta - a coisa colocada. Pensando aqui, ali talvez seja a coisa posta, colocada, atuada dentro do texto. Meu ali é a coisa.
Melhorando a questão, ali vem para cá mostrar que daquilo que escrevo aqui, é de lá que falo.
Ali nem é bem lá, mas é um entre aqui e lá, porque o ali, no meu ouvido, é meio desviado da linha reta entre este ponto, aqui, e aquele ponto, lá. 
Ouçam: ali é desvio, transversalidade. 
E, dando um passeio aqui e ali, talvez o Ali Baba era um desviado mesmo e chegou onde devia, sem dever, lá na montanha mágica do oriente. Se orientou pelo seu gênio, que situado ali, mais além do aqui de onde ele saiu e do lá onde deveria ter chegado.
Ali, é meu gênio, minha magia, meu tesouro, que surge para ser apagado a cada aparição e continuar correndo solto pelo meu aqui e agora.  Eu já estou ali.

Simone de Paula - 31/07/2020




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