sexta-feira, 10 de julho de 2020

Espírito maligno

A noite estava clara, tinha lua cheia no céu. A temperatura amena não estava de acordo com o inverno que já avançava pelo ano. Lúcia tinha deitado cedo, queria dormir bem porque os dias estavam muito atribulados e ela estava respondendo de forma descontrolada a isso tudo.Seguia a filosofia zen, pensamento positivo, good vibes. Ela mesma se desconhecia nesse estado afetado.
A casa comportava esse estilo zen. Escolheu o branco para dar um ar clean à decoração. Mas não quis que os móveis e objetos fossem muito retos, aparentemente duros, queria a fofura aconchegante de um edredom branco em tudo. Sofás confortáveis, tapetes macios, paredes bem lisinhas e armários embutidos sem puxadores, para ficar quase tudo leve, sem barreiras. Esse foi o pensamento desde que mudou para a vila do bairro em que nasceu.
Naquela noite, Lúcia não conseguia dormir, se mexia muito. as cobertas pareciam fazer peso sobre seu corpo. A cama estava dura e torta. Ela virava para um lado e outro, e nada. Já tinha levantado e aberto a janela, deixando a luz da rua entrar, mas ainda sentia tudo muito estranho no ambiente. Quando o sono vinha, um sonho fazia questão de acordá-la, parecia que pedia que ela ficasse alerta. 
Sonhou que era agressiva com amigos, porque eles não fizeram o que ela queria. Teve que conviver com a irritação deles no sonho. Acordou, virou de lado, dormiu de novo. Dessa vez sonhou com uma fachada de uma casa no alto da rua. Estava iluminada, uma espécie de galeria ou espaço cultural. Dentro, ela subia e subia, subia mais e mais, acompanhada pela anfitriã daquele lugar. Estranho, porque ela dizia para essa moça que já tinha morado ali. Acordou. Dormiu de novo e os pensamentos invadiam seu sono e ela mesma dizia para si: há um encosto por aqui, um espírito do mal, tem coisa ruim nesta casa. Ela acordou com os pensamentos, mas não se mexeu e nem abriu os olhos. Tinha medo. Queria que aquela impressão sumisse. Não resistiu e olhou tomada de coragem. Viu na quina da porta, na passagem do quarto para a sala, luzes piscando próximas ao teto. Como se tivesse achado um pernilongo que zumbisse no seu ouvido, disse para si: olha lá o espírito maligno. Eram luzes em RGB - vermelho, verde e azul, as cores na tecnologia de tv - que circulavam pelo ar, próximas àquela quina, manifestando o tal mal que existia ali. Ela levantou em busca de escapar daquilo, sair da casa, mas quando passou pelo batente sentiu a força do espírito empurrá-la para o sofá, segurá-la ali, deitada, encurralada. O pensamento veio forte, começou a rezar para tentar se livrar disso. Nesse instante, Lúcia acordou. A luz do sol entrava pela janela e refletia nos cristais transparentes que estavam pendurados na janela. A refração fazia com que a luz atravessando a pedra refletisse no espelho e se projetasse na parede branca. Ali o brilho era encantado, quase magia.

Simone de Paula - 10/07/2020

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