sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Ócio, do verbo ociar


Americano transforma tudo em verbo. Dê a eles um substantivo e veja que verbo bem empregado, mesmo que sonoramente estranho, eles conseguem produzir. Estranho é para nós que não exercemos esse mesmo trabalho sobre a língua. Provavelmente para eles, que entendem esse fazer com a língua materna, já fica bem entendido o sentido de verbalizar os substantivos, transformar nomes em ações.  Esses danadinhos... parece que eles que inventaram, com seu jeito de falar, o sem fim de fazer, fazer, fazer em que vivemos hoje.
Que momento mais doido do mundo, a gente não pode parar de produzir nem um minuto. Retornamos ao ponto em que vamos desde o plantio até a venda da manufatura, tudo pelas mesmas mãos. Por mais sagrado que isso seja, num mundo em que temos excessos de consumo, a exaustão se instala. Não adianta tirar a religião de cena se o modo de vida é religioso.  Aliás, a estrutura da cultura e da religião funcionam do mesmo modo, por isso existem desde sempre. O Agamben, um dos meus crushes das letras, fala de um jeito gostoso das sacralizações.  
As mulheres estão abarrotadas, cansadas, doentes, o tempo todo. Estou generalizando, sim. Mas por quê não generalizar? Especificamos demais e isso cansa. Sintetize e generalize, porque não importa mesmo tanto assim. Voltando a elas, olham umas para as outras e dizem, “vamos lá! Não para, miga!” Jamais dizem, “para mesmo, sossega, dorme, descansa, faz nada, ocie bastante”.
O verbo ociar deveria ser conjugado com mais frequência. Borá lá fazer nada sozinhas, em casa, sem gastar nenhuma caloria. Dar um tempo para as calorias. É isso!!!! Porque elas estão aceleradas e desgastadas. Nem a caloria tem a mesma potência que tinha nos anos 80. O low carb veio com tudo tirar o protagonismo daquela figura incontável das nossas vidas. Decadente, a caloria não tem mais função, mesmo ativada 24 horas por dia. Tudo que parece novo é só substituto do que não funcionou plenamente no passado. Nem o pobre do ócio tem mais espaço, e justo ele que teve status de promover criatividade, despertar gênios por aí.
Este texto serve para quê mesmo? Para nada. É isso, um fazer para nada, sem finalidade objetiva, apenas um fazer isso aqui com aquilo lá.

Simone de Paula – 17/01/2019


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