Ontem no trem de Mumbai perguntei para uma garota se estava
no vagão certo, ela me responde que sim, busco por um lugar sentada, coisa que
pode valer quase ouro aqui na Índia. Entro correndo, me despeço da Tati ali
fora enquanto ela tira uma última foto e então começo a olhar as minhas
companheiras de viagem de Churchgate até Malad pela Western Line, ouço suas vozes
estridentes, sinto o cheiro de um dia todo de trabalho envolto em tantas cores,
tecidos e um cortante sol, mastigam comidas picantes e fritas enroladas no
jornal, falam no celular, entram ambulantes, brincos, pulseiras, mulheres
seguram os filhos tropeçando, até camarão fresco passou pela venda, deve ser
uma longa jornada pensei, a de cada um.
Já estou acomodada quando a mesma garota volta, entra onde
estou e me diz que está errado, esse trem é da linha rápida e não vai parar em
todas as estações. Começo a me movimentar quando do meu lado uma outra pega meu
braço e diz para ficar, ela é jovem, tem um lenço cobrindo todo rosto, mas seus
olhos ficam em evidencia, assim como a força de suas palavras. Elas conversam
em hindi, uma explica para outra que ele irá sim onde preciso, que a linha
rápida é até o meio do caminho, falam como se cada uma defendesse uma causa, a
velocidade, o destino, a hora de descer tornaram-se questões importantíssimas
ali. Agradeço as duas, me sinto protegida por elas, é a verdade do trem. As
vezes parece uma briga, mas do jeito de cada uma, do jeito delas no mundo,
estão apenas argumentando.
Venho todo o caminho pensando no dia que tive com minha
amiga pelas ruas da Índia, pelo bonito de ser alguém que conta com alguém, pela
coisa simples e amorosa que é saber-se em um terreno de solidariedade, mesmo
que não o veja com frequência, saber que essa terra não tem nome, ela pode ser
qualquer parte do mundo, se o mundo mora do lado de dentro.
Era noite, Malad estava próxima, a pequena muçulmana se
levanta em Goregaon, ela já vai sair, guardou o celular, atravessou pernas e
saris, chegou até a porta, ia partir, antes disso se virou, olhou nos meus
olhos e quase me disse
: pronto, logo é a sua hora de saltar, eu fico aqui. Está
tudo bem.
Eu olho para ela e digo em hindi: tatá! Ela sabe que me
despeço, agradeço e confio não só em nossa troca de sorrisos, mas em uma troca
de carinho de longe que nos demos, ouvimos e nos soubemos.
Cheguei em casa acompanhada.
<3
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