Chegou
em casa coberta de purpurina. Sabia que levaria a vida toda para limpar
aqueles fragmentos do corpo.
Era toda brilho: a roupa de lantejoulas, o
glitter na maquiagem borrada pelo suor, e agora ainda purpurina
com água de rosas borrifada a noite toda. Uma coisa era certa, suor e
lágrimas misturados com água de rosas era inebriante.
A noite tinha sido
uma simulação do mundo onírico. O tempo de sonhar acordado. Nas paredes
do salão, frases em neon vermelho tentavam transformar o lugar no
espaço liberado para os prazeres. “Realize o seu desejo”, “ experimente o
que você sonha”, “aqui não há privação”, esse tipo de coisa. Drinks
coloridos, roupas extravagantes, risadas exageradas.
Não dava pra dizer
que não tinha sido bom, aliás, a festa foi ótima. Mas tinha uma coisinha
que tinha permanecido desencaixada. Durante a diversão, não, mas no
caminho de casa. Quanto mais perto chegava do seu lugar, mais aumentava o
mal-estar.
Não
notou que um pensamento tentava invadir sua consciência. Não percebia
também que o evitava antes mesmo da primeira palavra se formar. Se
começasse, seria uma longa história margeada pelo fio melancólico do não
saber sobre si mesma. Criou uma resposta para essa sensação, excesso de
diversão. Não era uma má desculpa, mas não era totalmente verdadeira.
Banho
e cama. E nessa hora, mais uma vez caiu no mundo onírico. Os prazeres
vividos durante o sono não se assemelharam aos da festa. A angústia
tomou o lugar da diversão. A mistura de flores caindo do céu, a
sufocava. A boca parecia ser aberta por mãos gigantes e o medo de
engolir pequenos diamantes era aflitivo. O corpo parecia entregue a
todos que estavam ali, como se ela flutuasse, mas sem o conforto seguro
que isso poderia significar.
Ela não podia dormir, nem acordar. O corpo
pesado, morto na cama. A mente desviando desse aprisionamento, tentando
inventar formas de relaxar seu desespero. Ela nada sabia disso, mas
estava misturada com isso.
O
dia já tinha avançado quando ela finalmente acordou com a maior
ressaca. Não queria levantar. Olhava seu corpo dormente, entorpecido.
Caçava os caquinhos de purpurina espalhados pela pele, pelos, cabelos, na esperança de um dia recolher todos
os restos da passagem dela pela “festa da vida”.
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